terça-feira, fevereiro 26

Ela, contradição.


Ela ia e vinha com aquele vestidinho verde musgo desbotado de sempre. Nunca mudava, era sempre a mesma cena: eu ali parado, pensando em nada ou entretido em alguma conversa, e ela indo e vindo, passando por mim com um ar de displicência e carregando o meu olhar em seu encalço. Como és previsível! pensava eu... E como és irritantemente encantadora! Era exatamente isso, aquela garota de cabelo ruivo cintilante me fascinava de tal maneira a me deixar irritadiço por dias. E tudo nela era gritante demais... os olhos grandes como que num susto eterno, o nariz pequeno e delicadamente desenhado que causava um contraste enorme com o resto do rosto, a boca grande sempre disposta em um sorriso que era um misto de inocência e malícia... O gritante sempre me inquietou, sempre me causou uma certa ojeriza misturada com uma atração inexplicável... e todos os meus sentimentos e sentidos por ela eram uma contradição atrás da outra... A contradição era o meu vício, me levava a ciclos e mais ciclos nem um pouco saudáveis. Aquela garota ruiva do sorriso ingênuo-debochado personificava a contradição como mais ninguém era capaz. E eu sabia que, se num momento de fraqueza, deixasse ela entrar em minha vida, estaria perdido. Pessoas como ela não entravam na minha vida, era simples assim. E nada me era mais desconcertante do que admitir que eu não sabia lidar com alguém tão irradiante assim, logo eu, que sabia tantas coisas.


Irritadiço. Viciado. Perdido. Desconcertado. Eis o que sou hoje.
E ela continua indo e vindo com aquele vestidinho verde musgo desbotado de sempre.


"(...) como pode algo se originar do seu oposto, por exemplo, o racional do irracional, o sensível do morto, o lógico do ilógico, a contemplação desinteressada do desejo cobiçoso, a vida para o próximo do egoísmo, a verdade dos erros? "

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