quinta-feira, junho 19

Apegos

Acordei tarde, cabeça doída e estômago embrulhado. Deve ter sido porque dormi com a cabeça prensada na parede, pensei eu. Minha cabeça achatada contra uma superfície verde cheia de fotos e recortes explicava os sonhos bizarros e a sensação de meu cérebro estar numa torradeira; o pão já queimando.
(Hoje vai ser mais um dia daqueles. Mais um daqueles dias suspensos, em que acordo com a certeza de que serei convencida de que sou uma farsa. Então a farsa vai pôr mais uma pele de mentiras por cima de si e vai sair por aí, a esmo, misturando personagens e histórias.)
Alguém apertou o botão lá fora e um som ruiu por todo o apartamento. Não quero levantar, meu estômago dói, mas o botão parece que grudou na direção do ruído. Pés descalços, o chão melado do doce que derrubei e tive preguiça de limpar. Dificuldade de achar as chaves... sim, estão em cima da geladeira onde ele sempre deixava, não consegui me desapegar do hábito.
-Talvez você não tenha conseguido se desapegar de muitos hábitos, minha amiga. Só passei aqui pra ver como você está... e pelo visto está em pedaços. Já tomou os seus remédios hoje?
(Meds, meds, meds... you are not her but I care about you...)
A personagem mentiu que tudo já estava sendo devidamente metabolizado pelo seu frágil organismo. E após algumas palavras tolas, sozinha novamente fiquei. Sozinha comigo e com os apegos.
Acho que vou me colar na parede. Talvez estando toda lá, não sinta apenas minha cabeça no meio de uma prensa. E talvez - e só um talvez muito incerto - prensada na parede consiga eu esquecer de quem criou todos os meus apegos.

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